domingo, 3 de julho de 2011

Eduardo Coutinho


Eduardo Coutinho, um dos mais importantes nomes do documentário brasileiro, teve uma formação que passou pelo cinema, teatro e jornalismo, tendo inclusive cursado a faculdade de Direito em SP. Seu trabalho é caracterizado pela profundidade e sensibilidade com que aborda problemas e aspirações da grande maioria marginalizada, seja em favelas, no sertão ou na boca do lixo. Político, sem ser panfletário, traz a emoção humana sem sentimentalismo nem truques. Apenas expõe a realidade com um olhar atento e compreensivo, dando a voz (ao invés de manipular) e concedendo, na montagem, o tempo necessário em cada plano para que a     verdade das "personagens" possa se desvelar para a lente
Coutinho teve seu primeiro contato com o cinema no Seminário de Cinema do Masp, em 1954, dirigido por Marcos Marguliès. Foi revisor e copidesque da revista Visão (1954-1957) e segue para a França estudar no Institut des Hantes Études Cinématographiques (IDHEC) onde, durante esse período, passa também por uma experiência teatral, dirigindo "Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara Machado. Em 1960, já de volta ao Brasil, faz assistência de direção na peça "O Quarto de Despejo", de Eddy Lima, e integra-se ao CPC trabalhando na montagem da peça "Mutirão em nosso Sol", no núcleo de Chico de Assis, encenada durante o I Congresso dos Trabalhadores Agrícolas em Belo Horizonte (1962)
Inicia sua carreira cinematográfica na ficção, dirigindo e roteirizando longas em parcerias com Leon Hirzsman, Eduardo Escorel, Bruno Barreto e Zelito Viana. Entre as filmagens desses longa-metragens, integra-se a vários projetos do CPC da UNE, que lhe possibilitaram os primeiros passos no caminho de documentarista.
Esse período iniciou-se com a gerência de produção no episódio Pedreira de São Diogo, de Cinco Vezes Favela, dirigido por Leon Hirzsman. Abandona a equipe para dirigir no projeto UNE-Volante, em que documentava as várias cidades por onde passava o grupo (que jamais foi montado). Nessa época conhece (em Sapé, Paraíba) Elisabeth Teixeira, viúva do líder de ligas camponesas João Pedro Teixeira, assasinado em uma manifestação. Escolhido pelo CPC da UNE para dirigir o próximo longa após Cinco Vezes Favela, Coutinho propõe a realização de um longa em ficção sobre a vida de João Pedro Teixeira (após a recusa de João Cabral de Melo Neto de transformar em filme os poemas O Rio e Morte e Vida Severina) dando início ao projeto de Cabra Marcado para Morrer, ainda na versão ficção. O elenco seria composto pelos próprios camponeses que foram protagonistas do protesto, e a equipe contava com nomes como Vladimir Carvalho, Fernando Duarte, Marcos Farias e Cecil Thiré. As filmagens foram bruscamente interrompidas pelos militares, que acreditavam ser um filme produzido por cineastas comunistas cubanos.
Com a interrupção de Cabra Marcado, Coutinho trabalha em vários projetos no campo da ficção: ajuda Leon Hirszman em Maioria Absoluta, roteiriza A Falecida e Garota de Ipanema, do mesmo diretor. Dirige um dos episódios de ABC do Amor, (O Pacto), uma co-produção com a Argentina e o Chile e atua como diretor substituto no longa-metragem O Homem que Comprou o Mundo. Na produtora SAGA (criada com a intenção de realizar filmes capazes de dialogar com o grande público), dirige Faustão, inspirado na obra de Shakespeare (que fala da luta de classes e de pai e filho na região do cangaço). Ainda colabora, nessa época, nos roteiros de Os Condenados, de Zelito Viana; Lição de Amor, de Eduardo Escorel e Dona Flor e seus dois Maridos, de Bruno Barreto.
Em 1975 integra-se à equipe do Globo Repórter, onde ficou durante nove anos e, segundo o próprio Coutinho, foi uma grande escola que o fez optar pela carreira de documentarista. A equipe (que contava com nomes como Paulo Gil Soares, João Batista de Andrade, Fernando Pacheco Jordão, Washington Novaes e colaboradores como Hermano Pena, Jorge Bodansky, Oswaldo Caldeira e Alberto Salvá) apesar da censura da época, tinha controle sobre todo o processo e trabalhava com relativa liberdade. Os médias documentários em 16mm eram o "sujo" que maculava o padrão Globo de qualidade, tornando-se um diferencial também pela abordagem aprofundada dos temas. Nessa época, realizou Seis Dias em Ouricuri (sobre a seca e a dificuldade de trabalho no sertão), O Pistoleiro de Serra Talhada (sobre o banditismo no nordeste), O Imperador do Sertão (sobre o coronel Teodorico Bezerra) e O Menino de Brodósqui (sobre o pintor Portinari).
Os três primeiros filmes realizados no nordeste foram uma preparação para a retomada de Cabra Marcado para Morrer, documentário que tornou-se um dos marcos na história do cinema brasileiro, ganhando doze prêmios internacionais (Tucano de Ouro no Fest Rio/ 85, Coral de melhor documentário em Havana, Festival du Réel, em Paris, Festival de Berlim, Festival de Tróia/Portugal, Salso, na Itália, entre outros). O roteiro conta a história da filmagem interrompida pelos militares e narra a trajetória de Elisabeth Teixeira e seus filhos durante os dezessete anos que se passaram entre o antigo projeto de ficção e as filmagens do documentário.
Após o sucesso de Cabra Marcado, Coutinho sai da equipe do Globo Repórter e passa a dedicar-se à produção de documentários em vídeo, além de roteiros de séries para a TV Manchete, como 90 Anos de Cinema Brasileiro e Caminhos da Sobrevivência, de Washington Novaes (sobre poluição em SP). Em 1988 (centenário da abolição), é estimulado por Aspázia Camargo, secretária de Cultura no RJ, a realizar um longa-metragem sobre o negro na História Brasileira - inicia, então, O Fio da Memória, tendo como personagem central o artista negro Gabriel Joaquim dos Santos. Filmado originalmente em 16mm, o documentário só foi concluído após quatro anos, em parceria com os canais Lê Sept e Channel Four (Inglaterra). Em seguida, seguiu com a produção de documentários em video, da qual podemos destacar os seguintes média-metragens: Boca do Lixo (sobre catadores de lixo da região de São Gonçalo, RJ); Santa Marta-duas semanas no Morro (sobre a vida nessa favela); Volta Redonda - Memorial da Greve (sobre o memorial de Niemeyer, a partir das mortes de operários em uma greve); O Jogo da Dívida (sobre dívida externa brasileira); A Lei e a Vida (meio ambiente na nova Constituição Brasileira) e Romeiros do Padre Cícero (romaria a Juazeiro).
A partir de 1999, volta à direção de longa-metragens em video digital (posteriormente transferidos para 35mm), realizando Santo Forte (sobre religiosidade popular, através de depoimentos de moradores da favela Vila Parque da Cidade, RJ), premiado como melhor filme no Festival de Brasília. Em seguida, seguindo os mesmos moldes, filma o longa-metragem Babilônia 2000, no morro da Babilônia, RJ. Do mesmo modo que em Santo Forte, o filme é calcado em depoimentos de moradores, que na virada de 1999 para 2000, dessa vez revelam seus sonhos, frustrações e expectativas para o terceiro milênio.

Filmografia
Roteirista e Diretor:
1966: ABC do Amor (2o. Episódio: O Pacto) (ficção, 35mm);
1968: O Homem que Comprou o Mundo (ficção, 35mm);
1970: Faustão (ficção, 35mm);
Globo Repórter (médias-metragens) - redator, diretor e editor
1976: Seis Dias de Ouricuri /Pistoleiro da Serra Talhada;
1978: Teodorico, Imperador do Sertão;
1980: Portinari, o Menino de Bodosqui;
1981-1984: Cabra Marcado para Morrer (documentário, 35mm)
1987: Santa Marta: Duas Semanas no Morro (média documentário em vídeo);
1989: Volta Redonda, o Memorial da Greve (média documentário em vídeo)
1989: O Jogo da Dívida (média documentário em vídeo)
1991: O Fio da Memória (documentário, 35mm) (Cem Anos de Abolição);
1992: Boca de Lixo (média documentário em vídeo); (rot/dir); e A Lei e a Vida (média documentário em vídeo)
1994: Os Romeiros do Padre Cícero; (média documentário em vídeo)
1999: Santo Forte (documentário, 35mm)
2000: Babilônia 2000 (documentário, 35mm)
2002: Edifício Master
Como roteirista:
1965: A Falecida, dirigido por Leon Hirszsman (ficção 35mm);
1967: Garota de Ipanema, dirigido por Leon Hirszsman (ficção 35mm);
1973: Os Condenados, dirigido por Zelito Viana (ficção 35mm);
1975: Lição de Amor, dirigido por Eduardo Escorel (ficção 35mm);
1976: Dona Flor e Seus Dois Maridos, dirigido por Bruno Barreto (ficção 35mm);
1985-1986: Episódio de "Caminhos da Sobrevivência" (série para TV Manchete de Washington Novaes)
1988: 90 Anos de Cinema Brasileiro (série para TV Manchete em vídeo);

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